segunda-feira, 27 de abril de 2009

Giro giro

É ser empurrada para dentro do autocarro, ficar entalada entre dois chineses para depois levar com a porta na cabeça e os insultos do condutor. E perante a travagens nada simpáticas do senhor condutor, a Inês fazer uma pirueta ballet-style e cair para cima de um chinês e eu arrastar os óculos de outro perante outra travagem sem aviso.

É fazer sopa com pepinos porque achávamos mesmo que aquilo verde que comprámos no mercado era courgette.

É ter os senhores taxistas a mandar vir connosco porque não sabemos dizer em cantonense a rua do nosso trabalho. E não perceberem quando dizemos em cantonense a morada de casa.

É chatear-me um chinês por qualquer coisa para depois aperceber-me de que ele fala português. E ter senhoras nas lojas de beleza a impingirem whitening creams porque acham que eu estou morena demais (quando na verdade eu estou mais verde que outra coisa)

É os condutores desviarem-se de nós nas passadeiras, andarem em contra-mão, passarem por cima de raias e desconhecerem a utilização do pisca e os polícias olharem para outro lado. Mas se um gato morre na ponte lá estão dois polícias de guarda a colocar pinos de segurança.

É ouvir música coreana e chinesa aos altos berros ao fim do dia no trabalho quando o escritório já está vazio.

Coisas giras se passam em Macau.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Yangshuo



Foi certamente esta paisagem que inspirou os senhores que desenharam o planet Namek do Dragon Ball e outras peças de cultura menos populistas como aqueles poemas épicos Chineses. Se a pintura Chinesa tomou a forma daqueles traços leves quase etéreos foi com certeza para transmitir a neblina que quase sempre envolve os montes que rodeiam o rio Li. Porque toda aquela beleza imensa e forte impõe-se sobre todos os que a rodeiam.

A nossa viagem começou no barco de Macau para o aeroporto de Schenzhen, que fica já na China continental e onde tivemos de esperar umas 4 horas pelo voo porque o último barco para o aeroporto era cedo demais. Depois de uma hora de voo até Guilin, o taxista do hostel lá nos foi buscar e aterramos num quarto que nos padrões europeus seria um 3 estrelas.

No dia seguinte planeávamos passear por Guilin mas fomos desde logo desencorajadas pelas ruas imundas, os prédios sem qualquer preocupação em parecerem bonitos, um KFC em cada esquina. Fomos, no entanto, interpeladas por um chinês, o sr. Lee que trabalhava no Holiday Inn e falava muito bem ingles, e que nos levou para tomar um pequeno-almoço ocidental numa varanda com vista para o rio Li, aconcelhou-nos uma tour pelo rio até Yangshuo e antes de nos meter no minibus levou-nos a uma casa de chá para bebermos um cházinho (nuns copinhos mesmo pequeninos) e testemunharmos a cerimónia do chá. Depois disso foi entrar no mini bus, daqueles que nos fazem interrogar por onde andou e quem carregou lá dentro até um cais onde apanhámos uma barcaça que deveria ser de canas de bambu mas era na verdade de tubos de pvc (!!!). O passeio foi tranquilo, fora uma paragem a meio para carregar uma fámilia de chineses, que nos fez encostar à margem e quase virar o barco por causa das ondas. Depois do barco, mais um mini bus, desta vez aberto, mais um autocarro à pinha e lá chegamos a Yangshuo.

Yangshuo é, segundo o lonely planet da China (essa nossa bíblia), muito mais uma cidade internacional de climbers e trekkers que uma aldeia chinesa. Confere. Pelas ruas da vila vê-se imensos ocidentais, todos com um ar impecavelmente saudável de quem salvaria um desconhecido no meio do tsunami sem se despentear, muitas famílias, e também muitos turistas chineses. A vila está bem preparada, com barraquinhas a vender souvenirs, restaurantes com ementas que vão da pizza aos noodles em duas páginas, e hotéis e hostels baratos mas muito bons.

A nossa guia - a Shandy ou Sandy ou o que nos saisse no momento e que fosse parecido com isso - uma ex-camponesa que cedeu à tentação do turismo em vez de continuar a apanhar arroz, fez-nos logo um plano para os dias seguintes. Nessa noite, fomos ainda ver um espetáculo (Impressions) no meio do rio, uma espécie de cirque du solei à chinesa, com milhares de figurantes a compensar a pouca espetacularidade dos movimentos em si mas que ainda assim é impressionante. Para lá fomos na mota do irmão da nossa guia, eu e a Inês à pendura numa mota no meio do tráfego chinês (acho que não preciso de dizer mais nada).

No dia seguinte, alugámos umas bicicletas (a 20yuans cada - aproximadamente 2 euros) e fomos dar uma volta no countryside, para depois apanharmos umas canoas (estas sim de bamboo) e fazermos aquilo que eles chamam rafting (que é na verdade passar umas mini- barragens de cimento no meio do rio). Mas a paisagem é fantástica e ao longo do caminho vão se vendo os pescadores com os corvos amestrados que eles usam para apanharem os peixes e os trazerem para os barcos. Os corvos são criados desde bebés com o pescador e têm uma argola no bico para não conseguirem comer os peixes. Por seu turno, o pescador alimenta o corvo com pedaços pequenos que ele consiga comer. Juntos, na canoa, com o pescador com aquele chapéu típico, formam o cenário que todos esperamos ver quando vimos à China.

De novo em terra fomos subir o moon hill, uma montanha que tem no topo um arco em rocha com um buraco no meio. Porquê moon hill? Não sei.... os chineses gostam muito de ver formas de objectos em coisa nenhuma e se calhar na China não existem arco-íris. A subida faz-se por degraus, o que é bastante tranquilo até à base do arco (arco esse que é escalado por alpinistas até ficarem com o corpo paralelo ao chão). Eu ainda quis subir ao topo do arco, ao que a guia me avisa que o caminho não tem escadas e está todo enlameado. Nada desanimada pela falta de folêgo que me fez parar inúmeras vezes durante a subia, e armada em lara croft, fui subir sozinha até ao topo do arco. Para cima tudo bem, para baixo, os santos não ajudaram em nada: a meio de uma rampa um pouco mais inclinada, mão numa rocha escorregadia, pé no meio da lama, cálculos mal feitos e estou eu a escorregar pela lama abaixo sem pudor nenhum pelas calças e pelos ténis novos. Claro que o resto do caminho fui um belíssimo espetáculo para quem se cruzou connosco. Mas a vista fez tudo valer a pena.

Nessa noite jantámos com os companheiros de viagem que chegaram nessa tarde, para acordar no dia seguinte com uma intoxicação alimentar que me prendeu à cama, e ocasionalmente à borda da sanita, durante o dia inteiro.

No último dia, apenas com uma torrada e duas colheradas de arroz branco no estomâgo acompanhados de comprimidos chineses, fui visitar as cavernas do buddha, umas cavernas tipo mira d'aire mas muito maiores e muito menos iluminadas. Para não desiludir, o nosso guia foi-nos mostrando as formações rochosas apelando à nossa imaginação para que víssemos num amontoado de rochas um macaco, um pé, uma mulher a tomar banho, uma borboleta. - Quantos anos tem a gruta? Que é que isso interessa!! - Quem descobriu? Sabemos lá... Ah, mas aquela rocha parece mesmo uma alforreca. Claro que a meio estava a ver-me a vomitar para cima do "pé" ou do "pescador que não comeu o peixe todo e o deixou a secar". Ainda fui levada às cavalitas pelo guia chinês por à quarta vez de me pedirem para tirar os ténis para atravessar um riozinho me recusar a fazê-lo e ameaçar voltar para trás. Depois disso desistiu de me perguntar o que é que eu achava que a rocha parecia.

No meio da gruta existem umas piscinas de lama onde se pode "tomar banho" e umas hot springs para o mesmo efeito. Não experimentei nenhuma, com medo que um movimento digestivo mais traiçoeiro impedisse o resto das pessoas de gozar o seu banhinho.

Após sair das grutas e comprar umas sandálias de ráfia a uma velhota por 10 yuans (sim 1€, e custavam 0,50€) voltei para o hostel, e de novo com a Inês decidimos dispender o resto do nosso escasso orçamento numa viagem de balão, porque o dia estava bonito e porque a perspectiva de poder vomitar a 400m de altitude me pareceu deveras engraçada.

Depois de mais um passeio de mini bus (eles aqui gostam mesmo dos mini bus) fomos parar a um descampado onde os senhores pilotos enchiam os balões. Com o balão já cheio, entrámos para o cesto para só então perceber que íamos assar o resto do caminho inteiro com o fogo que põe o balão no ar. O voo foi muito tranquilo, partilhado com dois americanos e uma americana, alpinistas, com quem fomos a fazer um bailado de troca de lugares para todos vermos de todos os lados do balão. Por duas ocasiões íamos esbarrando (pensámos nós) contra os penhascos, mas a mestria do nosso balonista, vestido de fato de macaco à top gun, impediu que o pior acontecesse. Entretanto o vento tornou-se mais forte, o que nos impediu de aterrar no local previsto pelo que nós perguntámos: - Where are we going to land? - ao que ele responde - Dunno. Don't woly, it's ok. Tão ok que acabámos por aterrar no meio de um cemitério, num impacto que foi já de si bastante forte (tenho uma nódoa negra no joelho para o comprovar), mas que acabou por fazer o balão voltar a erguer-se no ar e dirigir-se para uma laje no meio do cemitério. Nós já a ver o filme todo do cesto arrastado pelo balão, a bater na laje e o resto..... nem quisemos imaginar. Felizmente o cesto bateu efectivamente na campa mas rodou e acabou por parar. Logo a seguir começaram a parecer de todos os lados crianças e velhos para vir ver a atracção do momento: um balão com 5 estrangeiros aterrados nas campas dos avós deles.

Nessa mesma noite regressámos a Macau numa viagem que demorou quase 10 horas (só uma de avião) e cujo roteiro foi o seguinte: taxi (1h10) até guilin, avião em guilin, sair em shenzhen, já não há barco para macau, táxi até à fronteira de huangang (45min) atravessar a fronteira (30min) apanhar um autocarro até à fronteira do lado de hong kong, entrar noutro autocarro até ao centro de hong kong (1h), apanhar um táxi até ao ferry, apanhar o ferry das 4 da manhã porque perdemos o das 2.30 por 2 minutos, chegar a macau, passar a imigração e táxi até casa. E assim chegámos, eram 5 e tal da manhã a casa, para ir trabalhar no outro dia.

As fotos por serem muitas estão todas aqui para quem quiser dar uma olhadela:


terça-feira, 7 de abril de 2009

Sightseeing em Macau

Tenho aproveitado os fins de semana em que não há viagens planeadas para descobrir os recantos a Macau.

Existem imensos templos espalhados pela cidade, onde os residentes fazem as suas oferendas aos deuses, rezam, e encomendam felicidade e prosperidade, pagando com incensos gigantescos, que na maior parte das vezes infestam os templos de um cheiro quase insuportável. O principal templo em Macau é o templo de A-Ma que fica perto do mar.

E agora um bocadinho de história: Especula-se que o templo foi construído pelos pescadores chineses residentes de Macau no séc. XV, para homenagear e adorar a Deusa A-Má (Deusa do Céu), chamada também de Tin Hau, Mazu ou Matsu. Esta divindade taoísta é muito venerada em todo o Sul da China e em várias partes do Sudeste Asiático e é considerada como a protectora dos pescadores e marinheiros. Crê-se que os portugueses desembarcaram pela primeira vez em Macau, possivelmente no ano de 1554 ou 1557, precisamente à entrada do Porto Interior, também chamada pelos pescadores chineses de "Baía de A-Má". Segundo as lendas do séc. XVI, o nome da Cidade deriva precisamente da palavra em cantonense"A-Má-Gau", que significa literalmente Baía de A-Má.

O templo é uma confusão de incensos, panchões inteiros, restos de panchões rebentados, oferendas, mais incensos, velas, estátuas e figuras, mais incensos. Outro templo que já visitei, o Kun Iam Tong é sensivelmente a mesma coisa, o que acaba por tornar os templos como as vacas nos Açores (apesar de eu nunca ter estado nos Açores): é muito giro ver a primeira, a segunda tem piada e à terceira já não queremos ver mais vacas à frente. E em Macau há imensos pequenos templos espalhados pela cidade. Para ser justa perante a liberdade de cultos que aqui se vive também não faltam igrejas. Mas dessas também já vi muitas.


Este é o jardim que se encontra por detrás da praça do Tap Seac. Apesar de estar bastante destruído (o está lago praticamente vazio) é ainda assim muito engraçado. As curvas e contracurvas da ponte servem aparentemente para desviar os maus espíritos que não devem ter muita agilidade na perseguição.

Ao pé das ruínas de São Paulo, temos a fortaleza do monte e o museu de macau, que também ja visitei em duas ocasiões diferentes. O museu de macau é muito interessante e nada aborrecido, com imensas maquetes e expositores interactivos para por exemplo ficarmos a conhecer o ritual de casamento macaense (muito complexo, pesquisem). A vista de cima da fortaleza é impressionante: temos diante de nós todos os contrastes de macau: o bairro de lata e o casino, os predios chineses, os prédios ocidentais, o tradicional e o moderno.
O museu de macau
A vista do topo da fortaleza

Na ilha da taipa fui às casas-museu, que so visitei por fora mas que ainda assim valeu a pena. A vista é engraçada e as casas têm um aspecto colonial que caberia perfeitamente no livro Equador (apesar de ser noutro continente), no meio das tardes de calor infestadas de mosquistos, onde o ar não circula e a húmidade quente acarinha a inércia.
Nas casas museu

Coloane é dos lugares mais bonitos de Macau. A uns meros 15 minutos do centro, parece que entramos noutra dimensão. Ali, o brilho dos casinos não tem lugar, e a vila vai permanecendo longe da especulação imobiliária conservando ainda um carisma de vila de pescadores. Existem, claro, mansões luxuosas e barcos e carros grandes, mas as zonas verdes ainda são vastas e a calma impera, o que alivia da confusão cosmopolita de Macau. Fui visitar os estaleiros navais, meio ao abandono, e uma esplanada de um restaurante italiano.
A vila de coloane
Os estaleiros navais

As futuras incursões pelas atracções de Macau deverão incluir o farol da guia, mais umas igrejas e outros tesouros. I'll keep you posted

quinta-feira, 2 de abril de 2009

O trabalho na China

O conceito de trabalho aqui na China é completamente diferente daquele que temos na Europa. Trabalhar enquanto o acto de exercer actividade é comum, mas a questão da produtividade ou relevância desse trabalho é perfeitamente irrelevante. O trabalho é visto (suponho eu) como forma de entreter as pessoas e dar vazão à crescente população da China. Por isso é mal pago, por isso vemos gente a mais a fazer trabalho a menos.

Passo a demonstrar o que quero dizer: quando se apanha o barco para Hong Kong, na zona onde verificam os bilhetes temos quatro pessoas a realizar quatro funções extremamente importantes: uma risca o bilhete com um lápis de cor verde, a outra corta o canhoto do bilhete, a terceira empilha os canhotos e a última ficaliza a actividade, não vá alguém por engano riscar o bilhete com um lápis vermelho ou quiçá aldrabar as pilhas de canhotos.

Descendo as escadas para embarcar temos mais duas pessoas a indicar qual será o porto de embarque, porque olhando para o gigante ecrã luminoso seria muito difícil chegarmos lá. Ainda antes de entrar no barco temos mais um senhor que atribui os lugars do barco com pequenos autocolantes, o que seguramente não poderia ser feito por um computador nem por um dos verificadores de bilhetes. Era muito confuso.

De vez em quando vemos uma ou outra pessoa especada no meio do hall numa honestidade imensa perante aquilo que provavelmente lhe mandaram fazer: nada.

Exemplos destes encontram-se em todo o lado: demasiados empregados num restaurante, lojas de roupa com mais gente a atender do que a comprar, etc.

E depois gera-se um ciclo vicioso: os casinos empregam muitas pessoas sem grandes qualificações, o que faz com que os jovens desistam de estudar para ir trabalhar para qualquer lado, o que multiplica por necessidade estes postos de trabalho para encher chouriço. Ainda estou para ver como é que este sistema se vai aguentar à crise.